Doze entidades de classe e organizações não governamentais (ONGs) pediram para ingressar, como parte interessada - amicus curiae -, na ação direta de inconstitucionalidade (Adin) que questiona a validade do sistema conhecido como "pipeline", que permite a revalidação de patentes estrangeiras no Brasil. A ação foi ajuizada em abril pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
O que está em jogo é a perda do monopólio de 565 patentes concedidas por meio do instituto, a maioria para medicamentos. Se o pipeline for considerado inconstitucional, as patentes caem em domínio público. Associações que representam indústrias químicas, farmacêuticas e de medicamentos genéricos querem acompanhar de perto o processo.
Hoje, pelo menos 333 medicamentos considerados essenciais - utilizados, por exemplo, no tratamento de câncer e aids - têm a patente protegida. A controvérsia surgiu quando a Lei nº 9.279, de 1996, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, passou a considerar patenteáveis os produtos alimentícios, químicos-farmacêuticos e medicamentos, que até aquele momento não eram passíveis de proteção no país.
Pelo pipeline, as patentes concedidas no exterior eram validadas automaticamente no Brasil, ou seja, sem a análise do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), como ocorre com as patentes nacionais. Foi exigido que os pedidos de revalidação fossem feitos em até um ano da vigência da lei, maio de 1997.
A legislação limitou o prazo de vigência das patentes a 20 anos. Enquanto o INPI entende que a validade dessas patentes é contada a partir da data do depósito feito no país de origem, os laboratórios internacionais brigam, no entanto, para terem o prazo prorrogado em função de suas patentes terem sido estendidas no exterior.
Um dos pedidos para ingresso na ação foi feito pela Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), uma ONG que batalha pelo acesso aos tratamentos e medicamentos relacionados à doença. De acordo com estudo realizado pela associação, o gasto brasileiro com cinco medicamentos concedidos sob vigência do pipeline, usados no tratamento da Aids entre 2001 e 2007, foi de aproximadamente U$$ 420 milhões, conforme o preço de mercado estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Para Francisco Viega Neves da Silva, do setor de projetos da Abia, o montante mostra o que poderia ter sido economizado pela população e pelo Estado se as patentes fossem quebradas. Em 2007, o governo quebrou a patente do Efavirenz, medicamento utilizado no tratamento da Aids e que estava sob a proteção do pipeline. "O Brasil confiou nas decisões de escritórios estrangeiros e não examinou o critério de novidade das patentes exigido pela lei", diz Neves.
Até agora, apenas o pedido de amicus curiae da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma) foi deferido pela ministra Cármen Lúcia, relatora da ação. Os demais ainda não foram analisados. A ministra acatou o argumento da associação que reúne 28 laboratórios - eles representam 54% do mercado brasileiro de medicamentos e seriam responsáveis por promover o ciclo de pesquisa e desenvolvimento de medicamentos inovadores.
Procurada pelo Valor, a Interfarma afirmou, em nota, que acredita que "a Lei de Propriedade Industrial, aprovada em 1996 após intensos e produtivos debates, foi uma importante conquista da sociedade brasileira, e tem permitido enormes avanços em matéria de inovação, não apenas no campo farmacêutico. Por isso, defende que ela seja mantida e respeitada, integralmente".
Valor Economico
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