Poucas drogas estão tão presentes em nossas vidas quanto o paracetamol, o analgésico encontrado em vários remédios contra resfriado e no Tylenol, para dor de cabeça. Porém, recentemente, um comitê consultivo federal dos EUA levantou preocupações sobre danos ao fígado que podem ocorrer com o uso exagerado de paracetamol. O painel chegou até a recomendar que a FDA (Food and Drug Administration, agência que regula fármacos e alimentos nos Estados Unidos) barre a venda de dois populares remédios com prescrição, o Vicodin e o Percocet, por conterem a substância.
A notícia deixou muitos consumidores confusos e alarmados. Será que o uso regular de paracetamol para alívio da dor pode trazer riscos de longo prazo para o fígado? Para ajudar a esclarecer a confusão, aqui estão algumas perguntas e respostas sobre o tema.
Em primeiro lugar, o que levou o comitê a observar de perto o paracetamol?
Todos os anos, cerca de 400 pessoas morrem e 42 mil são hospitalizadas em decorrência de envenenamentos por paracetamol. Quando usada conforme orientação médica, a droga não é perigosa. No entanto, o paracetamol está presente, hoje, em tantos produtos, que é relativamente fácil que alguém tome uma dose acima do limite diário recomendado, de 4 g.
"Muitas vezes, as pessoas não sabem em que produtos o paracetamol está presente", disse Lewis S. Nelson, médico toxicologista da Univeridade de Nova York e presidente do painel consultivo. "Não é difícil ultrapassar a dose de 4 g. Você toma a dose máxima de paracetamol por causa de uma dor de cabeça. Depois, talvez, você toma um Tylenol PM ou Nyquil, para aliviar uma gripe. Suas costas doem, então você toma Vicodin – pronto, você provavelmente já tomou 7 g de paracetamol."
O que exatamente recomendou o painel de especialistas?
Além da proibição de comercialização do Percocet e do Vicodin, ele solicitou que a FDA diminuísse a dose máxima diária recomendada de paracetamol, dos atuais 4 g, correspondente a aproximadamente 12 comprimidos do Tylenol normal. A nova dose máxima provavelmente será de 2,6 a 3,25 g – ou de oito a dez comprimidos normais.
O painel também recomendou que doses "extra fortes" – equivalentes a dois comprimidos de 500 mg – sejam vendidos somente com receita médica, e que a maior dose disponível sem receita seja limitada a comprimidos de 325 mg. Também foi recomendado que as doses para bebês e crianças sejam padronizadas para evitar erros.
Como precaução, os consumidores deveriam tomar outros tipos de analgésicos vendidos sem receita?
Definitivamente, não. Todas as drogas têm riscos e efeitos colaterais, mas os riscos gerais do paracetamol, para qualquer indivíduo, são baixos. Muito mais pessoas são prejudicadas pelo uso regular de aspirina e ibuprofeno, pertencentes à classe de medicamentos chamados antiinflamatórios não-esteróides (ou AINEs). Segundo estimativas, mais de cem mil americanos são hospitalizados todos os anos, devido a complicações associadas aos AINEs. De 15 a 20 mil pessoas morrem de úlcera e hemorragia interna relacionadas ao uso desse tipo de droga.
Em contrapartida, existem somente cerca de dois mil casos de insuficiência do fígado aguda, e cerca de metade deles está relacionada à toxicidade de drogas. Dos casos induzidos pelas substâncias, 40% se devem ao paracetamol, e metade desses são resultados de overdoses intencionais. "Praticamente todos do painel reconheceram que, de uma perspectiva de saúde pública, o ibuprofeno é muito mais preocupante do que o paracetamol", disse Nelson.
Para usuários do Percocet e do Vicodin, o cenário é mais nebuloso. A dihidrocodeína, o narcótico do Vicodin, não está disponível como droga separada. A oxicodina, o narcótico presente no Percocet, continuará disponível. No entanto, esses ingredientes são rigorosamente controlados, e as receitas podem exigir mais burocracia.
Se eu estou usando um medicamento como o Vicodin, devo me preocupar com riscos de longo prazo ao fígado?
Os riscos associados à overdose de paracetamol são insuficiência do fígado aguda ou imediata, porém não há casos de doenças crônicas. Mesmo se você toma Tylenol ou outras drogas com paracetamol há anos, não existe razão para se preocupar com danos ao fígado no longo prazo, desde que você as tome de acordo com orientação médica. Comparando esse fato com o uso regular dos AINEs, como aspirina e ibuprofeno, podem ocorrer problemas gastrointestinais crônicos, com o tempo.
Uma overdose de paracetamol geralmente não produz sintomas imediatos. Em vez disso, a hepatite induzida pela droga tem probabilidade de se desenvolver dentro de uma semana, levando a perda de apetite, náusea, vômitos, febre e dores abdominais. Urina escura e icterícia (pele e olhos amarelos) sugerem um caso mais grave. Geralmente, o fígado se recupera quando o tratamento com a droga é interrompido, mas muitos pacientes que sofrem de falência hepática aguda podem morrer sem um transplante.
Cerca de 15% dos transplantes de fígado resultam de intoxicação por drogas. Num estudo, 40% dos transplantes de fígado estiveram relacionados ao paracetamol, 8% a drogas contra tuberculose, 7% a tratamentos de epilepsia e 6% a antibióticos.
Qual a principal lição em relação ao paracetamol?
Pelo fato de que a droga está presente em tantos produtos, os consumidores precisam estar atentos e ler os rótulos. Eles devem monitorar a quantidade dessa droga ingerida diariamente.
"Seria uma vergonha se as pessoas, ao lerem essas matérias, tivessem a ideia de que o paracetamol não é seguro", disse Dr. Paul Watkins, diretor do Drug Safety Sciences, do Hamner Institutes, na Universidade da Carolina do Norte. "É totalmente seguro, quando tomado conforme orientação. O problema é que as pessoas acabam tomando muito mais do que o recomendado, sem saber."
Jornalista: Tara Parker-Pope, do ´New York Times´
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