terça-feira, 23 de junho de 2009

Da estética à terapia

Da estética à terapia (Correio Braziliense - Brasília)

Jornalista: Rodrigo Craveiro23/06/2009 -

Russel McPhee, de 49 anos, procurou o médico para aplicações de toxina botulínica A — conhecida popularmente como botox. Não se sentia feio, cheio de rugas ou com linhas de expressão típicas de quem envelhece.

Seu problema era muito mais grave: em 1986, um derrame roubou-lhe os movimentos das pernas. O então jovem de 26 anos se viu preso a uma cadeira de rodas. Pouco depois do acidente vascular cerebral, Russel iniciou uma peregrinação por hospitais da Austrália. “Fui a vários médicos e eles tiraram minha esperança”, contou ao Correio, por telefone, de sua casa em Frankston, no estado australiano de Victoria.

“Eles disseram que eu nunca mais tornaria a andar e que eu morreria.” O australiano Nathan Johns, médico especialista em reabilitação do St. John of God Nepean Rehabilitation Hospital, acreditava no oposto.

Foram três aplicações da toxina botulínica tipo A (veja arte) nos músculos das panturrilhas e dos braços. A primeira ocorreu 18 meses atrás e, 10 dias depois, os músculos de Russel começaram a relaxar. Um mês após o início do tratamento, uma surpresa. “Eu não podia acreditar, não consigo explicar o que senti quando fiquei de pé. Foi fantástico.

Sou muito emotivo e chorei bastante. Como chorei!”, lembra o paciente australiano. Enquanto vertia lágrimas, ele dava os primeiros passos em mais de duas décadas. “Eu não imaginava de forma alguma que eu andaria novamente”, admitiu.

“Foi um milagre, mas o botox definitivamente me ajudou.” Johns disse à reportagem que seu paciente chegou ao hospital em Frankston com metas pessoais pré-estabelecidas. Queria voltar a andar.

“Desde 2004, temos usado a toxina botulínica como parte de um programa de reabilitação sob medida”, afirma. O especialista explica que a força muscular e a determinação ajudaram o paciente.

“Atualmente, ele pode caminhar dentro de sua casa com a ajuda de um andador. Durante nossas sessões de fisioterapia, ele consegue dar passos por 100m, com uma muleta. Sua marcha ainda é lenta, por causa da fraqueza de suas pernas”, acrescenta.

Ele garante que a condição de Russel tende a melhor com as sessões de reabilitação duas vezes por semana, combinadas à hidroterapia e terapia ocupacional. “Estamos trabalhando no fortalecimento e no estiramento de seus músculos, procurando aprimorar elementos funcionais, como a velocidade da marcha e o manter-se em pé”, comenta o médico. Duração O segredo da toxina botulínica A está na capacidade de bloquear a transmissão de sinais entre as células nervosas, levando os músculos a relaxar.

De acordo com Valentina Maric, fisioterapeuta de Russel, a toxina botulínica pode ser usada para tratar a espasticidade — aumento do tônus muscular — em pessoas com lesões cerebrais, esclerose múltipla ou sequelas decorridas de derrame e danos à medula espinhal.

A toxina botulínica, no entanto, não dura para sempre no organismo. A substância perde sua eficiência depois de três meses e, após esse prazo, o paciente precisa ser reavaliado por um especialista. Professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e coordenador do Serviço de Reabilitação do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Sérgio Lianza disse que a capacidade de reduzir a contração muscular levou a toxina botulínica a ser amplamente usada na década de 1970 como tratamento para os casos de estrabismo, à medida que ela possibilitava o reequilíbrio da musculatura que movimenta os olhos.

“O médico especializado em reabilitação pode injetar a toxina em músculos pré-selecionados por meio de exame clínico. Após duas semanas, o relaxamento atinge o máximo de seu efeito e se mantém por cerca de três meses”, explicou. “Casos como o de Russel são tratados de maneira semelhante no Brasil desde 1995”, garante Lianza. De acordo com ele, o Centro de Reabilitação da Santa Casa de São Paulo foi pioneiro na terapia com botox.

“Hoje, tratamos cerca de 100 pacientes por ano com medicação fornecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS)”, acrescentou. "Eu não podia acreditar, não consigo explicar o que senti quando fiquei de pé. Foi fantástico. Sou muito emotivo e chorei bastante. Como chorei!"Russel McPhee, paciente australiano

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